Rafinha Bastos não cometeu injúria contra feto de Wanessa

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Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Em Sentido Estrito nº. 0089908-35.2011.8.26.0050, da Comarca de São Paulo, em que são recorrentes/querelantes MARCUS BUAIZ e WANESSA GODOI CAMARGO BUAIZ, é recorrido MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO e Querelado RAFAEL BASTOS HOCSMAN.

ACORDAM, em 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

VOTO N° 27.534

Marcus Buaiz, Wanessa Godoi Camargo Buaiz, por si próprios e como representantes legais do nascituro que geraram, também querelante, interpuseram o presente recurso em sentido estrito contra a r. decisão de fls. 68 a 69, que excluiu o nascituro do polo ativo da ação penal privada que os recorrentes movem contra Rafael Bastos Hocsman, por infração ao artigo 140, “caput”, do Código Penal.

Alegam, em síntese, que o nascituro é parte legítima para figurar na ação como querelante, uma vez que a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro e que a configuração do delito de injúria não exige que a ofensa seja diretamente percebida pelo ofendido; ademais, as angústias e os impactos físicos e psíquicos que a mãe possa padecer em razão da prática da injúria, interferem no natural desenvolvimento do feto, atingindo-o.

Em abono das razões expostas no recurso, traz à colação doutrina e jurisprudência pertinentes à matéria (fls. 94 a 101).

Processado o recurso, com contra-razões (fls. 117
a 121) e manifestação do Ministério Público de 1º Grau (fls. 124 a 126), foi mantida a r. decisão recorrida (fl. 116).

Nesta instância, a douta Procuradoria Geral de
Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso (fls. 139 a 141), tendo vindo aos autos certidão de nascimento do nascituro, que foi registrado como José Marcos Doutel de Camargo Buaiz (fl. 112).

É o relatório.

Não procede o inconformismo, embora muito bem
lançado.

Constitui entendimento remansoso na doutrina e na
jurisprudência que a configuração do delito de injúria não prescinde da capacidade subjetiva do ofendido de sentir os efeitos da ação delituosa.

É que, segundo a lição de E. Magalhães Noronha,
Direito Penal, vol. 2/151 e 152, Saraiva, 1963, “A injúria é ofensa à honra subjetiva, de modo que a pessoa deve ter consciência da dignidade ou decoro.
Dizer, v.g., de uma criança de dois ou três anos que é um ladrão, de menina de quatro anos que é mentirosa, são coisas risíveis e que não podem configurar injúria”.

Com maior razão, quando quem se intitula ofendido é um ser ainda no ventre materno, o nascituro, que é a hipótese de que cuidam os autos.

Ainda que, segundo alegado, a angústia da mãe
possa refletir no desenvolvimento natural do feto, tal circunstância, porém, não é suficiente para a caracterização do elemento subjetivo do delito de
injúria, que exige tenha a vítima consciência da dignidade ou decoro, sem a qual não haveria tipicidade.

É certo que a limitação ou supressão da consciência da agressão não exclui a incidência do dano moral, questão pertinente à responsabilidade civil, cuja apuração ocorre em autos próprios, no juízo cível competente.

Daí o acerto da r. decisão recorrida ao proclamar
“inevitável se reconhecer que o nascituro não pode ser sujeito passivo de injúria, analisando-se que, no caso, não tem a mínima capacidade psicológica
de entender os termos e o grau da ofensa à sua dignidade e decoro” (fl.69).

Portanto, afastada a participação do nascituro do
polo ativo da ação, e tendo em vista a natureza do delito, cessa a competência da justiça criminal comum, que é deslocada para o juizado especial criminal, competente para processar e julgar o delito de injúria, nos termos da Lei nº 9.009/95.

Por essas razões, nega-se provimento ao recurso.

FRANÇA CARVALHO

RELATOR

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP